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Em parte erguida, em parte escavada na rocha, cercada por montanhas com intrincadas passagens e desfiladeiros, Petra representa hoje um dos maiores achados arqueológicos, um lugar espantoso onde tradições orientais antigas se misturaram com a arquitectura helenística

Fotos Jordan Tourism Board e D.R.

Património Mundial e habitada ainda na era pré-histórica, Petra foi erguida pelo povo nabateu entre o Mar Vermelho e o Mar Morto, assumindo-se como um importante ponto de passagem entre a Arábia, o Egipto e a Síria. E quem eram os nabateus? Chamados anteriormente de edomitas, os nabateus originam-se com Esaú, irmão de Jacob (que mais tarde muda de nome para Israel e estará na origem da linhagem de José, figura paterna de Jesus Cristo), ambos filhos de Isaac e netos de Abraão. Esaú e Jacob haveriam de passar por episódios que entre si promoveriam um profundo afastamento e o primeiro haveria de partir e fundar a cidade de Edom, de onde seriam então provenientes os edomitas, antecessores dos nabateus. Ora, com origem narrada na Bíblia, os nabateus foram um povo árabe nómada que no ponto geográfico onde actualmente visitamos um dos mais famosos centros da história antiga escolheram fundar a cidade de Petra em virtude da sua proximidade com as rotas comerciais de então. Conhecidos pelo talento para a construção e para a concepção de métodos eficientes de recolha de água em desertos áridos e para a escultura em rocha, os nabateus deixaram-nos assim uma herança que perdura desde o terceiro século antes de Cristo. Naquela altura era conhecida como Raqmu (nome aramaico do seu fundador) mas já fora Edom e também os edomitas lhe chamaram Sela (Pedra).

A rose-red city half as old as time

Petra seria precisamente a tradução grega desta palavra. Sob o domínio nabateu, Petra assumiria rapidamente o eixo do comércio de especiarias passando a representar um importante ponto de encontro entre as caravanas chegadas de Aqaba e as vindas de Damasco e Palmira num cenário arquitectónico de forte influência greco-romana e oriental que revela de modo claro a natureza activa e cosmopolita dos seus criadores. Localizada no sul da Jordânia e Património da Humanidade desde 1985, é absolutamente esmagadora dada a arte esculpida em rocha e o sistema de canalização de águas. Numa versão mais romântica é a Cidade Rosa graças à tonalidade das pedras com que há séculos foi erguida na encosta de Jebel al-Madhbah. Seria assim que, em 1845, e passados cerca de 33 anos depois de o aventureiro e explorador suíço Johann Ludwig Burckhardt a arrancar ao desconhecimento por parte do mundo ocidental, o deão da Catedral de Chischester John William Burgon a descreveria. “A rose-red city half as old as time”, frase do poema que celebrizou Burgon apesar de este nunca ter visitado aquele território em Petra, ficaria para sempre colada ao imaginário relacionado com a cidade nomeada em Portugal, em 2007, como uma das Novas Sete Maravilhas do Mundo e que a revista Smithsonian elegeria como um dos 28 lugares a ver antes morrer.

Desconhecida do mundo ocidental até ao século XIX

Do esquecimento escapou certamente a cidade que os nabateus acreditavam encontrar-se sob protecção do deus Dusares e a verdade é que vieram os romanos, com Pompeu a conquistar os territórios e no entanto a conceder relativa autonomia à cidade, veio Trajano que lhe retirou estatuto e a converteu em província sob controlo directo de Roma (Arabia Petrea), e até Adriano, que a rebaptizou como Adriana Pétrea num gesto de profunda vaidade que o tempo não perdoou, devolvendo a cidade à sua própria identidade, a de apenas Petra. Veio a deslocação das rotas comerciais, que começaram a afastar-se de Petra e a sua economia a ficar cada dia mais fragilizada. De Roma veio Constantino a deslocar a capital para Bizâncio, surgindo Constantinopla, a actual Istambul, e Petra a acolher um bispado, conhecendo então melhores dias até ao Terramoto de 336, que destruiu quase metade da cidade. Petra resistiria e erguer-se-ia de novo, apostando nomeadamente na construção de igrejas e de edifícios públicos. Acreditar-se-ia que Dusares estava atento… Até que 551 trouxe um novo abalo e desta vez uma profunda mudança consigo. O Terramoto de Beirute destruiria a cidade quase na sua totalidade. As rotas comerciais afastar-se-iam em definitivo e a Cidade Rosa jamais recuperaria da catástrofe, mantendo-se envolta em silêncio e solidão, talvez por cuidado de Dusares, até que o mundo ocidental despertou para o interesse nas suas ruínas, já no século XIX. Na verdade, desde a era das Cruzadas que nenhum europeu ali assinalava a sua presença, daí ser também conhecida como A Cidade Perdida.

Dusares ter-se-á mantido atento… Também chamado Ibrahim Ibn Abdallah, Burckhardt viria a revelar a magnífica cidade ao mundo ocidental em 1812. O extraordinário valor de Petra, com a vasta extensão de elaborados túmulos e templos, a arquitectura religiosa, os canais e túneis combinados com a profusa rede de cisternas e de reservatórios que controlavam e conservavam as chuvas sazonais e os vestígios arqueológicos das minas de cobre, dos templos, igrejas e de outros edifícios públicos é absolutamente impressionante. A fusão das fachadas de arquitectura helenística com a homóloga arte dos nabateus escavada na rocha representa, sem dúvida, uma conquista artística única e um conjunto arquitectónico dos primeiros séculos depois do nascimento de Cristo, a par com os vestígios arquitectónicos da era pré-histórica até ao período medieval, tornando-se este local um testemunho excepcional das civilizações desaparecidas que ali se sucederam no tempo. No coração das montanhas do Sahara, Petra terá sido, sim, protegida ou por Dusares ou eventualmente pelo próprio tempo, representando uma memória viva de eras passadas plenas de encanto, de mistério, de vida e de História.

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