O seu nome mais parece uma antiga palavra mágica e adivinha-se quase um encantamento a suceder-se ao momento em que é proferido. Do latim, Mongólia significa “Terra dos Mongóis” e a origem do termo também é incerta.
País sem costa marítima, a Mongólia situa-se na Ásia Oriental e Central, fazendo fronteira, a norte, com a Rússia, e a sul, leste e oeste com a República Popular da China. Trata-se de uma terra de cavaleiros nómadas e de estepes áridas que se prolongam até às montanhas irregulares ou ao extenso deserto de Gobi, cuja paisagem fria e ventosa invoca a memória de Genhis Khan, o grande imperador do século XIII, e das hordas mongóis. Tradicional e exótica, a sua cultura está intimamente relacionada com a herança nómada, com os ger (yurts) de cada a família, posicionados ao centro dos acampamentos e os cavalos a servir como único meio de transporte. Sendo o 18º maior país do mundo com menos densidade populacional de todo o globo, assiste à uma grande concentração dos seus habitantes na capital fundada originalmente em 1639 como centro monástico budista móvel. Naquela altura chamava-se Urga e localizava-se cerca de 400 quilómetros da sua actual posição, tendo durante este período e os finais do século XVIII sido movida para vários locais, já que a população que a habitava era nómada. Assumiu o título de capital em 1924, aquando da proclamação da independência da Mongólia, no seguimento do colapso do Império Manchu em 1911 e adoptando finalmente o nome por que hoje é conhecida. Aqui, as influências russas, chinesas e tibetanas misturam-se e os mosteiros budistas tibetanos transpiram o xamanismo mongol. Acolhe todos os anos o colorido Festival Naadam, que comemora a revolução de 1921 e que representa a festa mais popular do país, acreditando-se que exista desde há séculos, numa época em que constituía essencialmente uma celebração religiosa. Nele reúnem-se milhares de pessoas que competem nos “três jogos de virilidade” (de luta livre, tiro com arco e corridas de cavalos cross country), provas essas encaradas como testes de coragem e força de um verdadeiro guerreiro.
A capital
Especialmente durante o Inverno, altura em que Ulan Bator se destaca como a mais fria capital do mundo com as temperaturas a rondar os 30 graus negativos, esta cidade apresenta níveis de poluição do ar muitíssimo elevados, encobrindo muitas vezes a visão e causando até problemas de tráfego aéreo dada a intensa utilização de carvão que não só alimenta os fogões onde se cozinha (e que também servem para aquecer os gerts que circundam a cidade), como é empregada por parte das fábricas locais. Dada a situação geográfica da cidade, num vale e protegida dos ventos invernais pelas montanhas relativamente altas que impedem assim a circulação do ar, o problema agrava-se ainda mais. Ulan Bator contrasta brutalmente com o imaculado campo mongol, representando uma cidade extensa e industrializada na qual o comércio é vibrante, o trânsito intenso, a vida nocturna muito agitada e a contracultura bastante boémia. Ali, tanto podemos encontrar empresários com roupas Armani, como punks com moicanas e nómadas acabados de chegar das estepes. Num momento assistimos à passagem de um Hummer H2 para, no instante seguinte, no Mosteiro Gadam, ouvirmos os maravilhosos cânticos entoados por monges budistas. A visita ao Chinggis Khaan National Museum é absolutamente obrigatória, já que abriga mais de dez mil mostras originais que abarcam a fundação do primeiro estado nómada (Império Hun), os artefactos de imperadores e nobres dos estados mongóis e os inícios do século XX, recorrendo a tecnologia interactiva, a realidade virtual e ao vídeo e dispondo de peças de pintura, escultura, ferraria, costura, de bordados e de maquetes. O seu nome homenageia naturalmente a figura mais importante do país e da cultura mongol e muitíssimo relevante da história mundial, Genghis Khan.
Genghis Khan
Nascido Temujin, perto da moderna cidade de Ulan Bator, calcula-se que em 1162, Genghis Khan foi o fundador e primeiro khan do Império mongol que, depois de passar a maior parte da vida a unir as tribos mongóis, lançou uma série de campanhas militares conquistando, então, grande parte da China e da Ásia Central. Filho mais velho do chefe mongol do clã Borigin, Yesugei, e de Hö’elün, tinha apenas oito anos quando o pai morreu e a família foi abandonada pela própria tribo. Reduzido a uma situação próxima da pobreza, Temujin assassinou o meio-irmão mais velho para garantir uma posição de supremacia na família, fazendo uso da sua carismática personalidade para atrair os seus primeiros seguidores e formar alianças com dois importantes líderes das estepes que em conjunto o ajudaram a recuperar Börte, a sua mulher, que fora raptada por invasores. À medida que a sua reputação foi crescendo, a sua relação com Jamukha, um destes líderes, deteriorou-se culminando num conflito aberto e tendo sido derrotado em 1187, acreditando-se ter passado os anos seguintes como súbdito da dDnastia Jin até se reerguer em 1196, quando rapidamente readquiriu poder. Toghrul, o seu anterior aliado passou a encará-lo como uma ameaça, realizando um ataque surpresa em 1203 que obrigou ao seu recuo. Mais tarde Temujin reagrupar-se-ia e derrotá-lo-ia. Após derrotar a tribo Naiman e executar Jamukha, Temujin assumiu-se como líder absoluto da estepe mongol, adoptando em 1206 o título Genghis Khan. Levou a cabo reformas destinadas a garantir estabilidade e transformou a estrutura tribal mongol numa meritocracia integrada dedicada ao serviço da família governante. Começaria a consolidar o seu poder após frustrar uma tentativa de golpe de um poderoso xamã e em 1209 lideraria um ataque de grande escala ao vizinho Xia ocidental, que no ano seguinte viria a acatar as determinações mongóis. Seguiu-se uma campanha contra a Dinastia Jin, que durou quatro anos e terminaria com a tomada da capital Jin Zhongdu, em 1215. O estado de Qara Khitai, na Ásia Central, seria anexado pelo seu general Jebe em 1218 e no ano seguinte Genghis Khan invadiria o império corásmio em virtude da execução dos seus enviados, devastando as regiões da Transoxiana e de Khorasan ao mesmo tempo que Jebe liderava uma expedição que alcançaria a Geórgia e a Rússia de Kiev. 1227 marcaria o ano da sua morte, já perto dos 70 anos, enquanto subjugava o rebelde Xia ocidental. Até aos dias de hoje permanece como figura controversa. Era generoso e muito leal aos seus seguidores, mas implacável para com os seus inimigos. Recebia aconselhamento de diversas fontes com o objectivo de dominar o mundo, papel que acreditava ter-lhe sido destinado pela divindade xamânica suprema Tengri. Sob o seu comando, o exército mongol dizimou milhões de pessoas, mas as suas conquistas também possibilitaram trocas comerciais e culturais sem precedentes numa vasta área geográfica. É recordado como tirano selvagem pelo mundo russo e pelo mundo árabe, embora o mundo académico ocidental tenha recentemente começado a reconsiderar a sua imagem original como um bárbaro senhor da guerra. Após a sua morte foi endeusado na Mongólia e as gentes modernas deste território olham-no como o fundador da sua nação. Morto há cerca de 800 anos numa campanha militar, está ainda por apurar o paradeiro dos seus restos mortais. De acordo com uma das lendas, logo em 1227 milhares de guerreiros e escravos rumaram em segredo ao longo de centenas de quilómetros até ao local onde o conquistador mongol teria sido sepultado, transportando camelos carregados de tesouros provenientes de toda a Ásia Central. A lenda narra ainda que o seu corpo terá sido transportado para o local de descanso eterno pela guarda de honra que se terá também encarregue de matar todas as testemunhas que houvessem avistado o cortejo fúnebre, seguindo-se ainda um sacrifício dos guardas, de modo a garantir o próprio silêncio. O folclore mongol afirma que caso o descanso do grande soberano seja perturbado o mundo acabará. Uma coisa será certa, naquela época a cultura da sociedade mongol era de natureza nómada, existindo poucas cidades ou assentamentos fixos, e o recurso a túmulos ou enterramentos não era comum. Sempre que um guerreiro partia, prendia-se o cadáver ao próprio cavalo, que era depois enxotado de modo a percorrer as infindáveis estepes até que os restos mortais do seu senhor fossem definitivamente eliminados.
Visitas obrigatórias
Embora seja famosa dada a referência como local de nascimento de Genghis Khan, a Mongólia é muito mais do que se possa imaginar antes de uma primeira visita. A cultura nómada, os céus infinitamente azuis e o ambiente selvagem e intocado fazem-na parecer uma terra que resiste à rápida mudança a que assistimos no mundo ocidental. Ali prevalecem os vales verdejantes, os lagos azul-turquesa, os desfiladeiros, os pântanos, as dunas de areia, as montanhas cobertas de neve, os prados ondulados e as florestas alpinas, já para não falarmos dos costumes que os séculos souberam preservar. São 21 províncias e 330 distritos numa área de cerca de 1,56 milhões de quilómetros quadrados onde habitam apenas 3,4 milhões de habitantes. De norte a sul, o país divide-se em quatro zonas, a floresta montanhosa, a estepe alpina, as regiões semidesérticas e as desérticas paisagens do Gobi.
O azul lago de água doce de Khuvsgul, na província homónima, no norte, representa o melhor lugar para apreciarmos a natureza intocada e a 160 quilómetros, em Bayanzürkh, podemos apreciar os rios cristalinos e a cascata de Ushir a descer pelas encostas de penhascos perto de Bolshoi Rock. Ainda na mesma província, a Taiga Oriental constitui o lar do povo Tsaatan, os tradicionais pastores de renas. Para chegar lá será necessário conduzir por estradas montanhosas em más condições e levar a cabo uma difícil viagem a cavalo, mas as montanhas e os rios justificarão qualquer esforço.
As montanhas rochosas de granito de Ikh Gazryn Chuluu proporcionam uma sensação de imersão na cultura do deserto, realizando-se ali o Festival de Arte Uyakhan Zambuu Tiviin Naran. Na província de Khentii encontramos muitos lugares históricos, entre os quais diversos pontos ligados à vida de Genghis Khan, incluindo Khökh Nuur, o lago onde foi coroado, o Palácio Ikh, o Delluun Boldog, onde nasceu, e o mosteiro Gundgavirlan. Para meditar, há que não perder a visita ao Tövkhön Khiid, o mais bonito e mais complexo em termos de design de todo o país, localizando-se a cerca de 70 quilómetros de Kharkhorin e a mais de 200 metros de altitude. Um dos mais famosos pontos de referência da Mongólia, o Deserto de Gobi proporciona panorâmicas absolutamente fantásticas e não dispensa um passeio a pé, a cavalo ou de camelo. O Parque Nacional Gobi Gurvan Saikhan, na província de Umnugovi representa uma visita indispensável, sendo inclusivamente habitado por nómadas da Mongólia. É ali que se encontram as célebres “Areias Cantantes”, ou dunas de Khongoryn Els, assim baptizadas dado o som proveniente da areia movediça durante os ventos fortes. No Inverno, é o Yolyn Am, um impressionante desfiladeiro, quem adquire maior destaque.
Ao longo de 30 anos, no século XIII e nos séculos XIV e XV, Karakorum foi a capital do império mongol e da Dinastia Yuan, respectivamente. Entre os locais é conhecida como Har Horin, tendo sido visitada por Marco Polo no século XIII. Actualmente encontra-se em estado de ruínas e cercada por estepes. O destaque irá naturalmente para o Mosteiro Erdene Zuu, que se reveste de uma longa parede de estupas absolutamente incrível. Considerando que o território da Mongólia será tão vasto que numa só viagem se tornará um pouco difícil abarcar todos os pontos de real interesse, a primeira visita não deverá, no entanto, dispensar o Complexo da Estátua de Genghis Khan, situado a cerca de 50 quilómetros de Ulan Batar. Ali, uma estátua gigantesca do conquistador mongol montado a cavalo olha imperiosamente as estepes e as montanhas que o cercam. Com 40 metros de altura, foi construída em 2008 para assinalar o 800 aniversário da fundação daquele império, invocando o homem que, aos olhos dos seus seguidores e do povo actual, assumiu em muitos aspectos as características de um verdadeiro deus, tal foi a marca que deixou e resistiu à passagem dos séculos.