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Romana, moura e templária, Tomar guarda memória de séculos que se revelam à medida que nela passeamos. Dos tempos da Reconquista à actualidade, contamos-lhes a sua história e mostramos-lhe o melhor que ali existe e ali se faz

Foi Sellium e Thamara, primeiro pela mão do Imperador Augusto, quando no século I a tomou aos Túrdulos, e mais tarde, em 716, quando os muçulmanos ocuparam a região, e em virtude do nome Tamaramá (doces águas) que deram às águas do Nabão. A tolerância religiosa entre a população de diferentes origens só seria interrompida com a Reconquista levada a cabo por D. Afonso Henriques, tendo a terra sido doada à Ordem dos Templários. Gualdim Pais, então Mestre dos Templários em Portugal, ficou encarregue do comando e defesa da fronteira entre cristãos e árabes, e da construção e reconstrução de castelos para estes efeitos. A construção do Castelo de Tomar iniciar-se-ia a 1 de Março de 1160 pela ordem do fundador daquela que viria a tornar-se cidade em 1844 por ordem da Rainha D. Maria II. Seria daqui que os templários passariam a governar as vastas possessões no centro do reino. Estes, membros da Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão, representavam uma ordem militar de cavalaria que existiria até 1312 (e desde 1118), fundada no final da Primeira Cruzada com a finalidade de proteger os cristãos durante as peregrinações a Jerusalém. Professavam a pobreza, a castidade, a devoção e a obediência, envergando mantos brancos com uma cruz vermelha. O crescimento do seu poderio económico, a par com as enormes dívidas que o rei Filipe IV de França perante a ordem detinha, contribuiria para que o Belo conseguisse pressionar o Papa Clemente no sentido de dissolver a ordem, tendo-se levado a cabo uma verdadeira perseguição aos templários em toda a Europa.

Morada da Ordem Templária em Portugal e sede da Ordem de Cristo

Em Portugal, o rei de então, D. Dinis, lograria persuadir o Vaticano a criar uma nova ordem (de Cristo) transferindo todas as propriedades e pessoal dos templários para a mesma e sedeando-a em Castro Marim, no Algarve, mas assistindo-se ao seu regresso a Tomar já em 1356. O Descobridor Infante D. Henrique seria mais tarde instituído governador desta mesma ordem, beneficiando de vastos recursos e conhecimentos por ela proporcionados para a realização das expedições marítimas em África e no Atlântico. Mar adentro partiam então as naus portuguesas ostentando sobre o branco das velas a cruz que ainda hoje nos é tão familiar.

Da chegada do povo judeu às invasões francesas

O seguinte episódio marcante da história de Tomar leva-nos à expulsão do povo judeu em Espanha, afastamento promovido pelos Reis Católicos em 1492 e recebendo Tomar, onde já existia uma sinagoga, um elevado número de artesãos e mercadores refugiados. A cidade beneficiaria então de um novo impulso, dada a sua experiência e capacidade para o comércio, e assumindo o Convento de Tomar a sua forma final já no reinado de D. Manuel I. Contudo, em 1550, a perseguição dos judeus haveria de chegar a Portugal pelas mãos da Inquisição verificando-se uma marcante debandada destes para países como a Holanda, o Império Otomano e a Inglaterra, e também a terrível execução de inúmeros marranos em autos-de-fé, após a sua prisão e tortura. Tomar perderia por isso uma importante fatia do seu dinamismo económico. Nas cortes de Tomar de 1581 Filipe II de Castela seria declarado Filipe I de Portugal. Com a chegada do iluminismo a Portugal, já no século XVIII, Tomar tornar-se-ia um dos pontos industriais mais vibrantes do território nacional, tendo depois sido invadida por Napoleão e libertada pelas tropas luso-inglesas ao comando de Wellington.

Da Festa dos Tabuleiros à padroeira da cidade

Debruçada sobre Ferreira do Zêzere onde vai buscar o afluente Nabão, Tomar integra-se na bacia hidrográfica do Tejo, destacando-se a produção de azeite, figo e de vinha ali realizadas, mas com o turismo como principal fonte de receita, não esquecendo, no entanto, os dias em que as fábricas de papel, de fiação e de derivados de madeira constituíam o ponto alto da sua produção. Nas festividades destaca-se obviamente a Festa dos Tabuleiros, realizada de quatro em quatro anos no início de Julho (a próxima em 2023), e representando uma das mais antigas manifestações portuguesas cuja tradição não dispensa a alusão às colheitas, tendo sido cristianizada pela Rainha Santa Isabel e mantendo-se até hoje a presença do cortejo com a chegada dos bois, o Cortejo do Mordomo, o Cortejo dos Tabuleiros, a sua forma, as indumentárias femininas e a Pêsa, ou distribuição de pão e carne. Também o Círio de Nossa Senhora da Piedade, no primeiro domingo de Setembro, merece a nossa atenção, tal como acontece com a Feria de Santa Iria, a padroeira da cidade, comemorada a 20 de Outubro.

O Complexo Monumental de Tomar

Na arquitectura e pela cidade fora, são muitos os monumentos a visitar, como o Castelo de Tomar, que integra o Convento de Cristo e que aquando da Reconquista se alinhou à Linha do Tejo juntamente com os castelos de Almourol, Idanha, Monsanto, Pombal e Zêzere. Reunindo traços românicos, góticos e renascentistas, foi declarado Património da Humanidade em 1983. O Convento de Cristo, que traduz o conjunto monumental do castelo, do Convento da Ordem de Cristo, da Cerca Conventual (Mata dos Sete Montes), da Ermida da Imaculada Conceição e do Aqueduto Conventual (de Pegões), nasce em 1420, altura em que o castelo servia de sede da Ordem de Cristo. O Infante D. Henrique transformaria então a casa militar num convento e adaptaria a alcáçova para sua própria residência. Tanto as intervenções de D. Henrique, o Navegador, como mais tarde as de D. Manuel I e de Dom João III e mesmo de Filipe II de Espanha fariam deste complexo um exemplo único que viria a ser reconhecido assim pela Unesco e do qual a Janela do Capítulo e a Charola são apenas alguns dos magníficos exemplos merecedores de uma atenção redobrada.

Uma sinagoga que é única em Portugal

Obviamente que a visita ao Aqueduto dos Pegões, à Igreja de São João Batista, de Santa Maria dos Olivais, de Santa Iria ou de São Francisco, a par com a Ermida de Nossa Senhora da Conceição, com a Capela de São Gregório ou o Convento de São Francisco, constitui, ela própria, uma razão válida que justifica a viagem até esta cidade que viu nascer nomes como Fernando Lopes Graça ou José-Augusto França. A própria Sinagoga de Tomar, único templo judaico proto renascença em Portugal, remonta a meados do século XV, data de chegada de um elevado número de fiéis e erguida sob ordem do Infante Navegador, que aparentemente protegia a comunidade hebraica. A conversão forçada ordenada por D. Manuel I em 1496 determinaria o final da judiaria e o encerramento da sinagoga, bem como a mudança do nome da rua para Rua Nova e o novo emprego deste espaço, agora utilizado como cadeia. Mais tarde a sinagoga foi transformada em Ermida de São Bartolomeu e depois usada como palheiro, adega e armazém de mercearias. Só em 1923 viria a ser adquirida por Samuel Schwarz, judeu polaco investigador da cultura hebraica que recuperou o edifício e o doou ao estado português para que ali fosse instalado um museu luso hebraico.

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